Como disse em meu perfil no Twitter, História de um Casamento é um filme que indico fortemente para filhos de pais separados. É um filme muito sensível e me fez lembrar da minha própria infância, apesar de não ter realmente muita relação com minha vida. O que venho fazer hoje é justamente explicar então porque esse é um filme para filhos de pais separados.
Explicando do que se trata, História de um Casamento narra o processo de separação de Charlie Barber (Adam Driver), um famoso diretor de teatro da cidade de Nova Iorque, e Nicole Barber (Scarlett Johansson) uma talentosa atriz que teve um momento de fama no cinema fazendo um filme mainstream onde mostrou os seios (the dream of californication) e mais tarde se transformara na estrela da companhia de teatro dirigida por Charlie. Em meio ao processo de separação está Hnery Barber (Azhy Robertson), o filho pequeno do casal. Cada personagem tem seu motivo para a separação e deixarei de dar mais detalhes a fim de evitar spoilers.
Apesar do enredo bem simples (é realmente simples, procurando em sites como a Wikipedia Brasil, a descrição do filme é feita em uma linha) o filme que tinha tudo para ser mais um romance mainstream com grandes bilheterias (afinal conta com grandes nomes do cinema atual) ou uma comédia romântica nos moldes de sempre surpreende pela incrível sensibilidade apresentada. Logo nas primeiras cenas vemos um monólogo de cada um dos personagens falando sobre as características que gostam no cônjuge e sentimos que essas personagens são pessoas, com personalidade e especificidades próprias. Sentimos que eles realmente tinham bons sentimos um pelo outro, e ao fim desse momento nos deparamos com uma sala onde estão o casal e um psicólogo tratando do processo de separação dos dois. Numa mensagem que parece querer dizer "infelizmente esse sentimento lindo não está mais dando certo. A vida deles não encaixa mais. E, apesar de eles se amarem, o casamento está acabando".
Bom, a partir dessa introdução começo minha análise pelo título do filme. Como eu disse, os personagens estão se separando, então por que não História de um Término? Ou qualquer outro título melhor que esse, mas que passe essa ideia. Por que História de um Casamento? O que me parece é que Noah Baumbach (diretor e roteirista de 50 anos que já ganhou Oscar de Melhor Roteiro em 2005 por The Squid and The Wale) vê o relacionamento dos Barber como história completa, com início, meio e fim. O que ele faz é apenas nos contar o desfecho dela. Mas de qualquer forma, o desfecho da História de um Casamento. Essa visão, que na minha opinião é simplesmente linda, mostra para o público os dois lados da história, e também que ao final do ciclo que envolveu Charlie e Nicole ainda restam bons sentimentos; ainda ficam boas lembranças, a noção da importância que um teve na vida do outro e, é claro, um filho. O término do casal acaba o casamento, mas não apaga o que veio com ele e ficará depois.
E é por isso que indico o filme para filhos de pais separados, em especial quando o término aconteceu ainda na infância. Os filhos são o principal fruto de um relacionamento amoroso e a consciência da mensagem que o filme tenta nos passar em suas duas horas faz com que entendamos melhor uma fase da vida que não estávamos preparados para entender ainda.
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| O filme me conquistou quando nos primeiros dois minutos o Charlie já ganha um trompete da Nicole |
Agora saindo da arte que emana da produção da Netflix e entrando em aspectos da produção, as atuações de Scarlett e Adam são absolutamente impecáveis e não atoa os dois concorrem a Melhor Atriz e Ator, respectivamente. Os pequenos gestos que Scarlett Johansson adiciona à Nicole tornam ela em alguém que realmente podemos nos conectar enquanto personagem, sua olhada para os próprias roupas ao receber o elogio da advogada em seu escritório e a batida de pé quando está muito braba (embora esse talvez seja o toque do diretor/roteirista) passam vivacidade. Adam por sua vez consegue fazer com o que o personagem soturno e de personalidade fechada ainda assim demonstre o carinho pelo filho, pela esposa que ele não queria perder e até mesmo por sua sogra. Adam tem a postura de um líder que todos se apoiam, mas que vive em um mundo a parte, sozinho em seus pensamentos.
Laura Dern é outro nome que chama atenção, interpretando Nora Fanshaw, a mãe de Nicole, uma atriz aposentada que ainda recebe muito dinheiro pelos royalties das séries que fazia na juventude, Laura consegue atrair a atenção do público em seu pouquíssimo tempo de tela por trazer uma personagem muito enérgica, alegre, cantante. Vencedora do prêmio de Melhor Atriz Coadjuvante no Critics' Choice Awards e no Globo de Ouro ela é talvez a grande favorita para ganhar o prêmio também no Oscar.
Ainda se tratando de atuações, mas dessa vez apenas um toque de pessoalidade de quem vos escreve esse texto, Ray Liotta e Julie Hagerty, os advogados, também foram muito bem. Eles realmente conseguiram me fazer ter MUITA agonia dos personagens e cultivar mais um pouco meu desgosto pela profissão.
O que também me chamou atenção, mas pelo visto não muito da academia, é o posicionamento de câmera de História de um Casamento. Em especial na cena da briga do casal, onde a câmera se comporta gravando Charlie de baixo para cima e Nicole na horizontal. Porém, quando ocorre uma cena onde Charlie está conversando com Henry, a câmera o grava de cima para baixo. Esses recursos ajudam a contar a história mostrando a forma com que os personagens se comportam perante os outros com quem interagem. Por fim, o take onde Charlie entra em seu quarto durante a briga e só podemos vê-lo por uma fresta na porta (visto abaixo) faz com que a edição nos coloque dentro daquela cena, nos trazendo mais próximo do desconforto.
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| Trecho de uma das melhores cenas de briga que já vi |
Por fim, vale falar como essa é uma das melhores brigas que eu já vi, se não for a melhor. Os dois personagens dizem coisas que não querem realmente dizer simplesmente pelo calor do momento, despejam o que guardavam por anos e é apenas um show de interpretação da dupla.
Dado todo o exposto, é claro que História da um Casamento não é um filme apenas para quem tem os pais separados, mas para todos que gostam de uma boa história. Para os que querem um filme que passa rápido. Para os que querem ter um motivo para chorar. Ou simplesmente para os que querem assistir a um dos melhores filmes da década, por fazer o simples tão bem, que é contar uma história.
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